O presente trabalho visa circunstanciar a política atual de inclusão social do sujeito excepcional. Nessa perspectiva, o conceito de inclusão funciona como alicerce de ações para analisar e avaliar serviços e políticas sociais. Compreende-se a meta da inclusão social como um processo de modificação dos procedimentos normativos da sociedade que organizam as capacidades a fim de unificar as características e estabelecer classes de equivalência, convidando cada indivíduo a reconhecer-se diferente dos outros, afirmando-se em sua individualidade. O sujeito excepcional é a expressão dos modos como as práticas educacionais, médicas e jurídicas trabalham o crivo normativo e relacionam o corpo consigo próprio, como o decompõem e o recompõem e o analisam em função dessa realidade: a diferença. Produto de um investimento político do corpo, essa diferença é aquilo que o excepcional não pode reivindicar pois é o lugar analisável das práticas sociais que o inventam.
Ao ordenar as multiplicidades, comparando-as e relacionando-as umas às outras numa lógica de individualização, a norma propicia a comunicação entre individualidades pois é a referência que o indivíduo usa para tomar a si próprio como objeto de investigação. A individualização normativa, para a qual cada sujeito é um caso, não desvela naturezas, ela é comparativa e só os desvios fazem sentido para as suas categorias, pois são expressões de uma relação. O anormal efetiva-se num jogo de equivalências em relação ao normal em termos de limites, ele está incluso na norma como fundamento de um possível. O trabalho normativo não procede por exclusão ou segregação, ele intensifica desvios pois visa aos corpos para adestramento e produção de um princípio de visibilidade que os faz voltar sobre si mesmos a fim de se reconhecerem e se distinguirem um do outro.
O excepcional se efetiva, então, como uma categoria de risco para a política higienista cujo trabalho de aferição pedagógica e jurídica sustenta uma racionalidade que decompõe, recompõe e ordena de forma complexa e gradual os processos vitais. O risco como um princípio de objetivação e campo de intervenção formaliza o cálculo das probabilidades e confere materialidade aos acontecimentos da vida.
O trabalho da norma como dispositivo de segurança vai servir para a gestão das populações pois o risco permite unificá-las e identificar os indivíduos que a compõem de acordo com mecanismos auto-referentes em um processo incessante de comparação. Assim, não há objeto que escape à normalização técnica pois esta é expressão das transformações científicas e tecnológicas referentes às necessidades de produção e ao processo de racionalização da sociedade moderna.
A aliança da norma com a medida comum permite interpelar as práticas sociais da modernidade a partir de suas técnicas de medida. Implicadas nesse registro, as práticas pedagógicas estão fundadas nos ideais de desenvolvimento das potencialidades, no desempenho e na produtividade do educando, na hierarquização do conhecimento e veicula uma política higienista do Estado moderno no governo dos corpos a fim de orientar uma profilaxia das relações do homem consigo próprio e com os outros. A função pedagógica é de um enquadramento moral de auto-regulação e de auto-interpretação para a explicitação de modos de ser. Essa pedagogia instrumentalizada pela hermenêutica do sujeito produz máquinas de fazer ver e de fazer dizer que remetem a uma lógica jurídica do dever e da norma; não há dizer ou ver sem um código, sem um critério de juízo dominante na cultura.
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