Vivemos numa profusão de incertezas, originárias em grande parte da constatação de que os avanços materiais da ciência quase invariavelmente, foram acompanhados de uma contrapartida de degradação, mostrando que as promessas de uso da razão como caminho incondicional para o bem-estar social e político, foram equivocadas.
Quer isso tenha materialidade ou seja produto de discursos, no mundo globalizado se manifesta como crise da humanidade, refletida na constatação das limitações das instituições modernas em solucionar problemas atuais.
Uma das instituições - dentre inúmeras outras - atingidas pela crise da pós-modernidade é o sindicato.
Nesse contexto, a pesquisa que apresentamos incide sobre o sindicalismo brasileiro, particularmente interessada no sindicalismo docente Os estudos brasileiros sobre o tema centralizam abordagens em duas vertentes: uma que reforça o papel sindical de resistência ao poder do Estado, objetivando reformulações pró-coletivistas; outra de crítica à desvinculação entre o que se diz e o que se faz, supondo uma teoria que, imersa num discurso, na prática não se faz realidade. A primeira ocultando a posição de manutenção e sustento ao modelo estatal intervencionista exercido pelos sindicatos, gesta a idéia de que o coletivismo, especialmente o socialismo - fim último do intervencionismo -, garante liberdade e bem-estar aos trabalhadores. O equívoco é de negligência à conspiração intervencionista nessa luta. Mesmo não sendo defesa dessa pesquisa, constata-se que a concepção liberal, rechaçada nos meios sindicais, mostra-se mais próxima de construir possibilidades liberadoras do que, no caso, o socialismo.
A segundo abordagem, mais comum, enreda-se num círculo vicioso. Pretende ou reformular a prática sindical culturalmente enraizada por uma positividade demonstrada, ou construir um arcabouço teórico que ampare o fazer consolidado.
A adoção de uma política de verdade que toma o pensamento de Michel Foucault como norte, resulta nessa pesquisa na inversão da direção geral de análise, entendendo que sindicatos são máquinas de poder que, para funcionarem, precisam que as palavras tenham uma dizibilidade e as coisas, uma visibilidade outra e que isso se repete independentemente do modelo estatal.
Entendendo poder como estratégia, o "problema" para essa pesquisa está na ignorância de que discurso e prática se constituem distintamente e invariavelmente operam em separado. Disso resulta compreender que toda vez que a maquinaria sindical é posta em funcionamento, em qualquer época, lugar, ou modelo estatal, é a partir da mesma matriz que se monta e funciona.
Nessa compreensão, a incidência da pesquisa sobre o Estado de Santa Catarina, sul do Brasil, torna-se metodologicamente justificada.
Transitando na contramão do consenso acadêmico brasileiro - necessidade de reformulação do modelo estatal ou de construção de práxis - o que se procura entender é, a partir dessa microanálise, como discurso e prática vão inscrevendo verdades que dão sentidos a comportamentos e atitudes, modelando modos de subjetivação. Não a dominação que o discurso sindical exerce e que a maquinaria pratica, mas as múltiplas formas de sujeição que ocorrem nos sindicatos enfocados. Tais modos de subjetivação são flagrados pela pesquisa, mas, num reverso quase obrigatório, também as resistências a essa mesma sujeição.
A atualidade da pesquisa é a sociedade de controle. Sindicatos são característicos da sociedade disciplinar.
Na intenção de responder como e por que na sociedade de controle sindicatos docentes são formas associativas majoritárias entre professores, percebe-se, que para um grande número dos docentes pesquisados são espaços conhecidos, onde se sabe exatamente como agir e o que deles esperar. Para a pesquisa, essa familiaridade reporta aos modos de subjetivação da sociedade disciplinar e se traduzem num "lugar" de aconchego, o que constitui um nicho de resistência às subjetividades emergentes da sociedade de controle. Uma singularidade, pois sindicatos acreditam-se vanguarda social.
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