Desde o início da década de 90, a violência urbana vem crescendo em freqüência e intensidade na cidade do Rio de Janeiro, uma das maiores e mais importantes do Brasil. O trabalho discute os diversos movimentos reativos que surgiram e se desenvolveram, no período, por iniciativa de ativistas de ongs, entidades de defesa dos direitos humanos, movimentos de organização de base e de mães de vítimas da violência. Apresenta como uma das novidades desses movimentos, que adquiriram grande visibilidade e relevância no cenário conflagrado da cidade, o recurso sistemático à linguagem e aos rituais religiosos para falar de violência no espaço público. Politizando a religião e religiogizando a política, esses movimentos vêm agregando indivíduos diferenciados em termos de crenças religiosas, pertencimento social, local de moradia, convicções políticas etc. em diversos atos e campanhas por tolerância, solidariedade e paz. Ao fazê-lo, atualizam no plano local uma tendência global de crescente presença de atores religiosos na cena política, entrelaçando valores, discursos e rituais referidos a cada um desses domínios. Analisa, especialmente, o movimento de mães de vítimas de violência, procurando compreender como religião e política se interpenetram e implicam mutuamente na busca de um sentido para a violência sofrida. Destaca, entre as modalidades de conjugação (de) e trânsito entre essas duas dimensões, o deslocamento da experiência de violência do âmbito privado para o público, com a transformação do "caso" em "causa" capaz de articular e mobilizar subjetiva e objetivamente diversos atores sociais. A tematização da violência envolve, então, uma forte demanda por direitos e justiça e estratégias de formação de opinião pública, reivindicação e pressão política. Paralelamente, entretanto, recorre às idéias de missão e de dádiva como fundamentos de uma ação política que incida sobre os corações para estimular a tolerância, praticar a solidariedade e promover a paz. Assim, se insere em um movimento de produção de mediações relativas aos conflitos urbanos, que tem por fundamento o estímulo e o disseminação de uma "religião civil" na sociedade brasileira.
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