In a famous episode described in his Confessions (Book VI, 3), St. Augustine expresses his confusion and perplexity to the attitude of his master and friend Ambrose whose eyes roam, in absolute silence, through the pages of a manuscript. How can we explain this astonishment that modern criticism has interpreted as a clear evidence that High Middle Ages, following the models of Classical Antiquity, mainly developed the reading aloud, rather than the Early Middle Ages that had invented silent reading? Through the privileged perspective of French Medieval Literature (but not only), these reflections aim to question the evolutionary and cognitive conception of the history of reading refocusing the problem in the irreducible tension - which has partly characterized Western culture - between the letter and the voice, between an idealization of the writing elevated into the magic sphere of the Sacred (or the Law) which places the oral performance under the sign of a corrupted fabula, and a long tradition that, from Plato to Hegel, assimilates logocentrism and phonocentrism. In this perspective, writing, a signifier of a signifier (Jacques Derrida), is nothing but a tarnished crystallization of the voice which emanates the entire Being and the unity of the word.
Num célebre episódio relatado no livro VI, 3 das suas Confissões, Santo Agostinho manifesta a sua perturbação e perplexidade perante a atitude do seu mestre e amigo Ambrósio cujos olhos deambulam, em absoluto silêncio, pelas páginas de um manuscrito. Porquê este espanto que a crítica se apressou a interpretar como uma inequívoca prova de que a Alta Idade Média, herdeira dos modelos da Antiguidade Clássica, cultivou essencialmente a leitura em voz alta, ao invés da Baixa Idade Média (essencialmente a partir dos séculos XI-XIII) que teria inventado a leitura silenciosa, prática que o progressivo alargamento das comunidades textuais (Brian Stock) viria acentuar de forma irreversível? Partindo do testemunho privilegiado da literatura francesa medieval (mas não só), estas reflexões visam questionar a conceção evolucionista e cognitiva da leitura recentrando a problemática na irredutível tensão - que tem em parte caracterizado a cultura ocidental - entre a letra e a voz, entre uma idealização da escrita erguida à esfera mágica do Sagrado (ou da Lei) que coloca a performance oral sob o signo da efabulação corruptora, e uma longa tradição que, de Platão a Hegel, assimila o logocentrismo a um fonocentristo em que a escrita, significante do significante (Jacques Derrida) não passa de uma cristalização redutora da voz da qual emana a totalidade do ser e a plenitude da palavra.
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