Bastou abrir a porta do trem para ser nocauteada. Nauseante e ocre, a força daquele cheiro penetrava pelos poros sem dó. Mesmo horas depois de tê-lo deixado para trás, assim como a poeirenta visão da estrada de ferro que liga Rabat, capital administrativa do reino do Marrocos, a Marrakech, centro do Império do Magreb, de Al-Andalus e de Yves Saint Laurent. Atravessei as muralhas avermelhadas da cidade em pleno Eid Al Adha,1 uma das duas grandes festividades islâmicas, com os dez milhões de receptores olfativos de meu sistema nervoso em estado de alerta. Nessa data, celebrada em memória de Ibrahim, que teria aceitado sacrificar seu filho Ismael segundo uma ordem de Deus, todos os muçulmanos que possuem recursos econômicos devem sacrificar carneiros, camelos, bodes ou cabras para relembrar o acontecimento. A carne do animal é distribuída entre familiares, amigos e pessoas sem condições financeiras, celebrando a partilha e a caridade. Seu aroma, contudo, impregna-se nas paredes e na memória. Indelevelmente (...)
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