Uma reflexão crítica sobre os caminhos e descaminhos das tecnologias contemporâneas se impõe com cada vez mais força na atualidade. Não se pode mais falar das dimensões “social” e “política” apenas se referindo à interação intersubjetiva; é preciso focar igualmente na interação humana com os aparatos técnicos. Tendo como pano de fundo a crescente digitalização da vida, acompanhada de processos de captação e armazenamento massivos de dados por parte de diferentes mecanismos e instâncias, gostaria de abordar, neste artigo, uma série de análises sobre os impactos do big data nos campos da economia, da política e da subjetividade a fim de colocar a seguinte questão: em que medida esse novo fenômeno não altera a configuração dos espaços de socialização e subjetivação, notadamente a esfera privada, de sorte a gerar um impacto na própria estruturação das democracias modernas? Tal questão se impõe na medida em que a antropologia política da modernidade é baseada, predominantemente, em uma noção substancial de sujeito autônomo, que possui na esfera privada um espaço fundamental de atividade e vivência cujo acesso lhe é privilegiado. Sendo assim, o objetivo do artigo é o de iniciar uma discussão sobre até que ponto as bases da antropologia política da modernidade não estariam sendo solapadas a partir de uma “mudança estrutural da esfera privada”, uma vez que o acesso privilegiado do indivíduo a determinados dados privados poderia ser suplantado pelo advento do Big Data, ameaçando um dos principais pressupostos teóricos e institucionais do liberalismo e da democracia moderna, a saber: a de que somos seres autônomos, responsáveis e os únicos capazes de legitimamente deliberar e tomar determinadas decisões. Procurarei trabalhar tal questionamento a partir de uma proposta de reatualização do conceito habermasiano de consciência tecnocrática.
A critical reflection on the paths and deviations of contemporary technologies imposes itself more and more strongly today. It is no longer possible to speak of the “social” and “political” dimensions simply referring to intersubjective interaction; it is also necessary to focus on human interaction with technical devices. Against the background of growing digitalization of life, accompanied by massive data capture and storage processes by different mechanisms and instances, I would like to address, in this article, a series of analyzes on the impacts of big data in the fields of economy, politics and subjectivity in order to ask the following question: to what extent does this new phenomenon change the configuration of spaces for socialization and subjectivation, notably the private sphere, generating an impact on the very structuring of modern democracies? Such a question is crucial since the political anthropology of modernity is based, predominantly, on a substantial notion of autonomous subject, who has in the private sphere a fundamental space of activity and experience whose access is privileged. Thus, the goal of the paper is to initiate a discussion about the extent to which the foundations of the political anthropology of modernity are not being undermined by a “structural transformation of the private sphere”, since the individual's privileged access to certain private data could be supplanted by the advent of Big Data, threatening one of the main theoretical and institutional assumptions of liberalism and modern democracy, namely: that we are autonomous, responsible beings and the only ones capable of legitimately deliberating and making certain decisions. I will try to work on this question based on a proposal to update the Habermasian concept of technocratic consciousness.
© 2001-2025 Fundación Dialnet · Todos los derechos reservados