Lênia Marcia de Medeiros Mongelli
O mito do Selvagem como tal é criação puramente literária, que teve sua configuração mais característica a partir do século xii; porém, termos limítrofes como exílio ou banimento, por exemplo, comuns na Alta Idade Média e referindo «o exilado», «o errante», apontam para realidades paralelas. Dentro da matéria arturiana, um bom testemunho é o ambíguo Merlin, filho de um íncubo (demônio) e de uma virgem (cristã), recolhido na floresta por decepção –com as guerras (Vita Merlini) ou com a amada (Suite du Merlin), que o enterrou vivo sob um rochedo. Sendo mito, a persona do Selvagem recua a remotas eras de convivência do homem com a floresta e com os animais, ligando-se inevitavelmente à tradição clássica greco-romana e à riqueza de lendas folclóricas –pagãs, cristãs, africanas, ameríndias, sempre no encalço de penetrar na complexidade daquela relação. Envolvendo, ainda, pares intrigantes como sanidade / loucura, cultura / civilização, o Selvagem, assim concebido, chega aos dias de hoje, aqui trazido pela óptica arguta de Guimarães Rosa. São as linhas gerais, e comparativas, do que se pretende examinar neste ensaio.
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