O paciente tipo que necessita de tratamento dentário tem vindo a sofrer alterações. É cada vez mais idoso, com polipatologias, polimedicado e cada vez mais exigente com a sua saúde oral. Estas alterações que trazem complicações acrescidas ao tratamento dentário, têm sido objecto de estudo sistemático em vários países europeus. No entanto em Portugal este processo não foi ainda convenientemente analisado.
Os objectivos deste estudo consistem: 1 - identificação das características e estado geral de saúde de uma população portuguesa incidente em tratamento oral; 2 - compreensão das relações entre as características populacionais e o seu estado geral de saúde; 3 - identificação das diferenças significativas das duas sub-populações incidentes em tratamento oral em função do local de tratamento seleccionado: clínica universitária e unidades privadas de saúde.
Através do questionário european medical risk related history (EMRRH) foram recolhidos os dados dos pacientes maiores do que 18 anos que necessitaram de efectuar tratamento oral e seleccionaram a clínica universitária da Universidade Católica Portuguesa em Viseu e em 21 regiões de Portugal: Trás-os-Montes e Alto Douro, Douro Litoral, Beiral Litoral, Beiral Interior, Estremadura e Alentejo, entre 2010 e 2011. Foram especialmente criadas duas aplicações informáticas para o efeito. Usaram-se os programas Microsoft Excel, G*Power e o SPSS para o tratamento estatístico. Este incluiu análise univariada para a determinação das características e estado de saúde da população estudada. A análise bivariada e multivariada permitiu o estudo das relações entre as características dessa população, o seu estado de saúde e as diferenças entre os subgrupos populacionais: clínica universitária; e unidades privadas de saúde. As hipóteses foram testadas com um nível de significância de 5%. A média de idades da população com 2941 participantes foi de 41,2 anos. Desses, 62% eram mulheres, 37% tinham estudos básicos ou inferiores, 34% tinham estudos médios e 29% eram licenciados. Cerca de 60% eram trabalhadores, 16% estudantes, 9% aposentados, 8% domésticas, 6% desempregados e 1% reformados por invalidez. Identificaram-se os 3 antecedentes patológicos mais prevalentes como: hipertensão com 18,8%; lipotímias com 16,2%; e arritmias com 8,6%. As 3 medicações mais frequentes foram: ansiolíticos e antidepressivos com 12%; antihipertensores com 11,9%; e anticolinesterásicos e antidislipidémicos com 4,3%. Os níveis de risco contabilizaram: ASA I com 44%; ASA II com 37%; ASA III com 10%; e ASA IV com 9%. Os participantes com antecedentes patológicos (AP) eram mais idosos, tinham maior probabilidade de serem mulheres e aposentados, p<0,05. Os trabalhadores tinham menor probabilidade de terem AP, p<0,05. Era mais provável encontrar riscos elevados ASA II, III e IV nas mulheres, p<0,05. O perfil do paciente que frequentou a clínica universitária era mais velho, homem, estudante, doméstica ou desempregado com um nível de escolaridade médio ou baixo, com mais AP mas com menor risco médico ASA, p<0,05. Tinha menor probabilidade de sofrer de hipertensão mas maior probabilidade de sofrer de lipotímias, p<0,05. O que seleccionou as unidades privadas de saúde tinha maior probabilidade de ser mulher, licenciado, trabalhador, ter risco médico elevado (ASA III e IV), sofrer de DCV, angina de peito ou arritmias, hipertensão, ter a sua tensão arterial normalizada, grau 3 ou desconhecer os seus valores, sofrer de asma, DPCO ou disfunções da tiróide, p<0,05.
O presente estudo realça a importância que a anamnese tem no tratamento dentário actual. O paciente tipo que recorreu a tratamento dentário, acompanha as alterações demográficas que têm vindo a ser observadas a nível Europeu e Portugal, em especial, nos últimos tempos. A elevada percentagem de pacientes com antecedentes patológicos e risco médico grave encontrada é motivo de preocupação em Medicina Dentária. Encontraram-se diferenças significativas entre os participantes que recorreram à clínica universitária e os que recorreram às clínicas privadas. Estes conhecimentos podem servir para a orientação da formação do aluno pré-graduado, para a educação continuada do médico dentista porque ajuda a compreender melhor a população incidente de tratamento dentário. Serve igualmente como ponto de partida para a análise das estruturas de saúde.
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